Denunciado pelo MPF por publicação no Facebook, cajazeirense é absolvido de acusação de crime racial

17/03/25

A absolvição no último dia 6 de março de Paulo Alves da Silva do crime racial pelo qual foi denunciado pelo Ministério Público Federal foi duplamente emblemática, pelo fato de a publicação ter se dado na rede social Facebook, considerada “ultrapassada e fora de moda” e no calor das emoções das acirradas eleições presidenciais de 2022, que polarizaram o Brasil.

À época, em três postagens, o paraibano natural da cidade de Cajazeiras, localizada a quase 500 Km de João Pessoa, Capital da Paraíba, desabafou: Nordeste: A pior pobreza, A pior educação, A pior violência. Mas continua votando na esquerda, aqui não merece cair nem chuva. Raça do caralho!”.

E prosseguiu: “Nordeste véi curral eleitoral de esquerda, Raça de bestas-feras”, o que segundo o Parquet, teria configurado discriminação e preconceito contra nordestinos crimes com previsão de mais de 5 anos de reclusão e multa.

Arrependimento e pedido de perdão

Citado, quando interrogado na fase policial e em juízo, ele confirmou a titularidade do perfil, a autoria das postagens e se profundamente arrependido de ter realizado as postagens, realizadas num momento de efervescência de paixões políticas e que não teve nenhuma intenção de discriminar ou ofender os nordestinos em geral, pois sua intenção era que as postagens atingissem indivíduos específicos.

E acrescentou: Explicou que o termo “bestas-feras” se tratava de uma expressão que era muito utilizada pelo seu pai, quando queria chamar a atenção de alguém num momento de ira e dizia “venha cá, besta-fera do inferno”.

Com relação ao termo “raça do caralho”, Paulo justificou que ela consta da letra de uma música da Banda Racionais, chamada “O homem na estrada”, que ele ouvia quando era adolescente, explicou que a referida expressão foi utilizada num momento de efervescência política, de paixões, que dividiu o país”.

Por fim, afirmou que estava passando por um momento de depressão e síndrome do pânico e usou palavras de forma equivocada, pois não tinha a intenção de discriminar ou menosprezar o povo nordestino, pois mora no Nordeste desde os 10 meses de idade e sua família e seu filho são nordestinos e que suas palavras eram direcionadas para pessoas específicas.

Quando do decisum, o magistrado reconheceu que a conduta do acusado, em tese, encaixa-se perfeitamente nos verbos núcleos do tipo penal praticar e incitar, eis que o usou expressões infelizes que inegavelmente envergonham e atingem a coletividade de pessoas nordestinas em razão de sua origem nacional, dando sentido de menosprezo ou discriminação ao povo nordestino pelas escolhas eleitorais que fez.

Falta de dolo

“Contudo, o delito do art. 20 da Lei n.º 7.716/1989 exige o dolo específico, ou seja, a intenção voluntária e consciente de que querer praticar os verbos nucleares do referido tipo penal, sem o qual o delito não se consuma. E no caso específico, o autor em nenhum momento demonstrou a intenção de praticar as condutas tipificadas na referida lei, eis que afirmou por diversas vezes em seus interrogatórios que suas declarações foram infelizes e proferidas em momento de efervescência de paixões políticas, ou seja, no mesmo dia das eleições gerais de 2022 em que o país estava dividido politicamente entre dois grupos (esquerda e direita)”, prelecionou.

Ao final, destacou que o acusado em seus interrogatórios demonstrou profundo arrependimento e reconheceu o teor repugnante de suas infelizes palavras, inclusive fazendo pedido de perdão público pelas suas infelizes palavras, bem como ser inegável que o termo “raça de bestas-feras” é uma expressão regional do interior do Nordeste em que os nordestinos a utilizam sem a intenção discriminatória de que se reveste a referida expressão.

“Embora a referida expressão mereça cair em desuso, de fato, não necessariamente aponta finalidade discriminatória, no contexto em que foi utilizada pelo acusado, pois lhe faltou o dolo subjetivo e específico de querer praticar os verbos nucleares do tipo penal do art. 20 da Lei n.º 7.716/1989”, arrematou.

Decisão justa

Questionado sobre o tema, o advogado José Bezerra Neto, do escritório Nóbrega, Bezerra e Moura, ressaltou sua confiança no Poder Judiciário que, neste caso, teve discernimento para identificar que seu cliente não teve a vontade deliberada de discriminar pessoas: “Uma decisão justa, compatível com o processo e com a orientação dos Tribunais Superiores”.