Ministro vota pelo fim da prisão antes do trânsito em julgado de sentença

O ministro Marco Aurélio Mello, do STF, como relator sorteado, votou em favor da libertação de todas as pessoas presas após uma decisão de segunda instância e que ainda tenham recursos pendentes de decisão em tribunais superiores.

O STF começou a julgar, na última quinta-feira, duas ações declaratórias que buscam a confirmação de artigo do Código Penal que afirma que ninguém pode ser preso, a não ser nas hipóteses de prisão em flagrante e preventiva, até que se esgotem as possibilidades de recurso de um processo, o chamado trânsito em julgado.

Em fevereiro deste ano, o STF admitiu o cumprimento de penas de prisão após a condenação por um tribunal de justiça estadual ou de um tribunal regional federal.

Julgamento interrompido

A decisão de libertar os presos, porém, depende do voto favorável de ao menos outros cinco dos 11 ministros da Corte. O julgamento, no entanto, foi interrompido e ainda não há nova data para a retomada da análise.

As duas ações foram ajuizadas pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e pelo Partido Ecológico Nacional. Ambas buscam a definição judicial e constitucional que as prisões só sejam autorizadas após o esgotamento de todos os recursos junto aos tribunais superiores – o STJ e o próprio STF.

A OAB e o PEN querem que o Supremo declare que o artigo 283 do Código de Processo Penal condiz com a Constituição de 1988. A regra do CPP diz que ninguém poderá ser preso, a não ser após a sentença condenatória transitada em julgado.

Fundamentos

Em seu voto, Marco Aurélio considerou o princípio segundo o qual “ninguém poder ser considerado culpado antes da sentença final do processo”. Para ele, “a literalidade do preceito não deixa margens para dúvidas: a culpa é pressuposto da reprimenda e a constatação ocorre apenas com a preclusão maior. A Carta Federal consagrou a excepcionalidade da custódia no sistema penal brasileiro, sobretudo no tocante a supressão da liberdade anterior ao trânsito em julgado da decisão condenatória” – afirmou.

O entendimento é o mesmo que o próprio Marco Aurélio havia expressado em fevereiro, quando o STF admitiu a prisão após a segunda instância, por 7 votos a 4. Na época, ele ficou vencido, ao lado dos ministros Rosa Weber, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski.

Antes de Marco Aurélio, subiram à tribuna para defender a mesma posição 13 advogados, representando a OAB, o PEN e diversas entidades ligadas à advocacia pública e privada. Pela OAB, o advogado Juliano Breda observou que “desde o julgamento de fevereiro do STF, centenas de prisões foram decretadas com franco e absoluto desrespeito à regra do Código de Processo Penal, sem que ela fosse declarada inconstitucional”.

Em nome do PEN, o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, notório defensor de políticos e grandes empresários, disse que não buscava beneficiar seus clientes e que nenhum deles estaria ameaçado pelo atual entendimento do STF. Castro disse “estar em defesa de pessoas sem condições de pagar advogados privados e que dependem da defensoria pública para se defenderem na Justiça”.

Em sua intervenção, a Defensoria Pública da União mostrou dados de sua atuação no STJ relacionados ao assunto. Assim, historiou que de 5.161 processos que tramitaram entre janeiro de 2015 e junho de 2016, 711 tiveram condenações na segunda instância que foram atenuadas no STJ.

Segundo o defensor Gustavo Zortea, “há uma pouquíssima confiabilidade num título de segunda instância para que ele possa servir de norte para o início da execução antecipada”.

Riscos à delação premiada

A seu turno, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse que “uma eventual revisão na jurisprudência do STF pode inibir atuais ou futuras negociações de delações premiadas”

Ele acrescentou o entendimento do MPF de que “este julgamento é tão importante como o julgamento no Supremo que definiu o poder investigatório do Ministério Público. Eu acho que isso influenciará, com certeza, em vários processos de colaboração premiada em curso ou que virão em todas as investigações do Ministério Público, seja federal, seja dos Estados” – ressaltou.

(ADCs n ºs 43 e 44)